Ver também: - Documento de estratégia 2002 - 2007
COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS
Bruxelas, 24.10.2007
COM(2007) 641 final
COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO CONSELHO E AO PARLAMENTO
EUROPEU
sobre o futuro das relações entre a União Europeia e a República de Cabo Verde
[SEC(2007) 1415]
1. INTRODUÇÃO (PT 2 PT)
Nos últimos anos, o Governo e a sociedade civil de Cabo Verde manifestaram várias vezes o desejo de que as relações entre Cabo Verde e a União Europeia evoluam no sentido de uma ''parceria especial''.
Cabo Verde mostra cada vez mais interesse em estreitar os laços com a União Europeia e, em especial, com as regiões ultraperiféricas (RUP) da União Europeia situadas no Atlântico
Norte. Com efeito, Cabo Verde constitui, juntamente com as ilhas europeias dos Açores,
Madeira e Canárias, o conjunto designado Macaronésia, onde desde sempre se foram tecendo ligações históricas, culturais, linguísticas e de complementaridade que caracterizam ainda hoje as suas relações e a sua cooperação.
Esta orientação tem origem na história antiga e recente de Cabo Verde e da Europa, marcada por relações humanas e culturais estreitas, bem como pela experiência comum de
acontecimentos importantes e a partilha de valores sociopolíticos fortes. Com efeito, a
sociedade cabo-verdiana foi-se constituindo desta forma, tecendo laços históricos, humanos, religiosos, linguísticos e culturais inextricáveis com a Europa. A sociedade cabo-verdiana é o resultado da fusão dos povos europeu e africano e do diálogo entre as respectivas culturas. O país defende igualmente valores como a democracia, a defesa dos direitos humanos e a boa governação política e económica e as garantias oferecidas pelo Estado de direito em vigor em Cabo Verde, e procura também promover a paz, a segurança e a luta contra o terrorismo e a criminalidade. Por último, Cabo Verde tem uma vocação natural para servir de ponte entre os continentes africano, europeu e americano, o que constitui o elemento fundamental em torno do qual a Europa e Cabo Verde partilham interesses e desafios comuns.
A aproximação de Cabo Verde à União Europeia visa nomeadamente intensificar as relações e aumentar a integração entre as RUP e este país; além disso, Cabo Verde partilha com a União Europeia várias prioridades estratégicas, nomeadamente no que diz respeito a certas questões relacionadas com a segurança, como a luta contra os tráficos ilegais (droga,
imigração clandestina, etc.). Neste contexto, Cabo Verde deverá participar enquanto parceiro numa cooperação policial e judiciária reforçada com a Europa. Graças à sua posição geográfica, o país pode dar um contributo substancial para a luta contra os tráficos ilegais e a sua abertura em matéria de segurança constitui um dos seus principais pontos fortes no processo de aproximação à UE.
Assim, a parceria especial destina-se a reforçar a concertação e a convergência das políticas
entre ambas as partes, permitindo acrescentar um quadro de interesses comuns à relação
tradicional dador-beneficiário.
2. O CONCEITO DE "PARCERIA ESPECIAL UE/CABO VERDE"
A parceria especial representa uma abordagem política que ultrapassa a mera relação
de dador-beneficiário e responde assim a outros interesses comuns em matéria de
segurança e desenvolvimento. Inscreve-se no contexto da aplicação do Acordo de
Cotonu e procura explorar todos os aspectos do Acordo que permitem definir um
novo modelo de cooperação UE/Cabo Verde.
A parceria especial UE/Cabo Verde não pode em caso algum constituir uma
alternativa a Cotonu, pretendendo, pelo contrário, aprofundar e alargar a cooperação
entre ambas as partes.
(PT 3 PT)
Cabo Verde deseja ultrapassar o quadro das relações existentes e alcançar um grau de
cooperação significativamente maior, sendo dada prioridade à aproximação às RUP,
nomeadamente proporcionando a este país acesso ao mercado interno. Neste
contexto e tendo em conta os riscos emergentes que representam desafios comuns,
prevê-se que Cabo Verde comece progressivamente a participar nalgumas políticas e
programas da UE, nomeadamente nos domínios abrangidos pelo plano de acção.
3. ABORDAGEM DA PARCERIA ESPECIAL UE/ CABO VERDE
A abordagem seguida obedece a uma dinâmica inovadora, pragmática, progressiva e
de complementaridade, elementos-chave da parceria especial:
3.1. Abordagem política: a parceria especial destina-se a reforçar um diálogo aberto,
construtivo e pragmático que se deve traduzir em acções concretas, que são a própria
essência da parceria especial.
Prevê-se que o quadro estratégico global da parceria especial seja representado por um plano de acção que cubra as prioridades previstas no processo de
desenvolvimento da parceria especial e integre os instrumentos tradicionais de
cooperação previstos no Acordo de Cotonu.
3.2. Abordagem de complementaridade: a parceria especial procura encontrar formas
de cooperação susceptíveis de completar e reforçar as acções tradicionais executadas
até ao presente no âmbito do Acordo de Cotonu. O Documento de Estratégia relativo
ao país e o Programa Indicativo Nacional do 10.º FED reflectirão a "abordagem
parceria especial''. Além disso, serão utilizados outros instrumentos para apoiar a
parceria especial, tais como o FEDER no âmbito da cooperação com as RUP, as
rubricas orçamentais temáticas, outras rubricas orçamentais geridas pela Comissão e
a parceria UE/África para as infra-estruturas.
3.3. Abordagem progressiva: é dada prioridade à promoção de um processo evolutivo,
de uma série de actividades de cooperação concretas, novas e complementares da
actual cooperação no âmbito da luta contra a pobreza; estas actividades
aprofundariam ainda mais as relações UE/Cabo Verde. O plano de acção será
flexível, de forma a poder ser progressivamente adaptado à evolução do país e das
suas relações com a União Europeia e os países terceiros.
3.4. Abordagem baseada nos princípios da boa governação: o elevado nível de
governação alcançado por Cabo Verde está na base da parceria especial. Um dos seus
pilares é a realização de novos progressos neste domínio, em consonância com a
prioridade que a União Europeia e Cabo Verde atribuem às questões relativas à
governação.
3.5. Abordagem de integração regional: tendo em conta as características específicas
de Cabo Verde, a parceria especial pretende valorizar a vocação deste país para uma
aproximação às RUP e ao resto da UE, intensificando simultaneamente as suas
relações com a sub-região da África Ocidental e no âmbito da CEDEAO
(Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental).
(PT 4 PT)
3.6. Abordagem de convergência em matéria de normas e padrões europeus: esta
convergência facilitará a aproximação progressiva à UE, e às RUP em particular, e
reforçará as vantagens comparativas do país.
4. NOVAS PERSPECTIVAS OFERECIDAS PELA PARCERIA
A parceria especial oferece nomeadamente as novas perspectivas seguintes:
• revalorização do alcance e da intensidade da cooperação política;
• aprofundamento das relações económicas e comerciais, que serão
progressivamente alargadas para criar condições favoráveis ao desenvolvimento
do sector privado da economia e ao aumento dos investimentos e das exportações;
• convergência da legislação e das disposições normativas em matéria económica e
técnica entre Cabo Verde e a UE, que permitirá a abertura recíproca da economia,
em especial através da redução progressiva dos obstáculos às trocas comerciais,
igualmente com os países da região, paralelamente ao progresso económico e ao
aumento da competitividade;
• perspectiva de ultrapassar o quadro das relações existentes e aprofundar
significativamente a cooperação, sendo dada prioridade à aproximação às RUP,
incluindo através do acesso de Cabo Verde ao mercado interno, bem como da
possibilidade de participar progressivamente em certas políticas e programas da
UE, designadamente nos domínios abrangidos pelo plano de acção;
• reforço da cooperação administrativa e judicial;
• criação sistemática de redes de informação e de bases de dados comuns;
promoção de actividades de intercâmbio e de geminações, com vista à
aproximação da legislação, regulamentação, normas e práticas de Cabo Verde ao
acervo comunitário em todos os domínios abrangidos pelo plano de acção.
5. ESTRUTURA DO PLANO DE ACÇÃO PARA A PARCERIA ESPECIAL
O plano de acção para a parceria especial articula-se em torno dos seis seguintes
pilares:
5.1. Boa governação
O programa basear-se-á em políticas de governação prosseguidas pelo Governo e
incidirá, designadamente, na lista dos compromissos anexos ao Documento de
Estratégia relativo a este país referido no ponto 3.2.
Neste contexto, será dedicada especial atenção à consolidação e ao aprofundamento
da democracia, do Estado de direito e da participação da sociedade civil na vida
política do país, bem como ao reforço do diálogo político e da cooperação, em
especial em matéria de democracia e de direitos humanos.
Será prestada uma atenção redobrada aos direitos das crianças e das mulheres, à
integração dos imigrantes em situação regular e à luta contra a violência doméstica.
(PT 5 PT)
O Governo procederá a uma reforma do sector da justiça e aplicará um plano
nacional de luta contra a corrupção.
O país deverá continuar empenhado na reforma das finanças públicas, bem como na
reforma e no reforço das capacidades da administração pública, nomeadamente no
domínio estatístico. O Governo prosseguirá também as iniciativas destinadas a
melhorar o quadro empresarial, a governação no domínio social e a boa gestão dos
recursos naturais.
5.2. Segurança/estabilidade
Este pilar abrangerá principalmente as seguintes vertentes: a segurança e a luta contra
a criminalidade organizada transnacional (cooperação no âmbito da luta contra o
terrorismo, o tráfico de seres humanos e o tráfico de migrantes, o tráfico ilegal de
droga e de armas e o branqueamento de capitais), promovendo o respeito pelos
direitos humanos; a gestão eficaz dos fluxos migratórios, incluindo a melhoria da
contribuição da diáspora cabo-verdiana para o desenvolvimento do país (remessas
dos emigrantes), e a luta contra os fluxos ilegais; a segurança marítima.
Pela sua natureza, as acções previstas no âmbito deste pilar só poderão ser
organizadas e executadas numa base transfronteiriça e regional, nomeadamente
através de uma aproximação às RUP no contexto da parceria especial.
5.3. Integração regional
(1) A nível das RUP, a integração do espaço da Macaronésia, com o objectivo de
melhorar a sua estrutura e aumentar o seu dinamismo e competitividade, está
em consonância com a política da "vizinhança alargada''. Assim, convém
incentivar todas as medidas destinadas a intensificar as relações entre as RUP
e Cabo Verde em todos os domínios abrangidos pelo plano de acção,
nomeadamente uma maior participação de Cabo Verde no programa de
cooperação transnacional Madeira, Açores, Canárias (MAC) 2007-2013, bem
como nos mecanismos e instâncias de concertação e de cooperação existentes
nas RUP.
(2) A nível da África Ocidental:
– Examinar, juntamente com a Comissão da CEDEAO, a possibilidade de
ter em conta as características específicas de Cabo Verde no âmbito do
Acordo de Parceria Económica (APE);
– Na medida do possível, incluir Cabo Verde na atribuição dos recursos ao
abrigo dos Programas Indicativos Regionais (PIR) do FED para a África
Ocidental.
Nestes dois contextos, será dedicada especial atenção ao desenvolvimento de
condições propícias ao crescimento e ao desenvolvimento sustentável, ao
investimento directo estrangeiro e ao desenvolvimento de empresas competitivas e
de uma administração mais eficiente, nomeadamente através da melhoria do quadro
empresarial, da harmonização com as normas e padrões da UE, do desenvolvimento
das condições de segurança, especialmente nos sectores dos transportes, das
(PT 6 PT)
comunicações e da energia, bem como do reforço das infra-estruturas nacionais e
regionais.
5.4. Convergência técnica e normativa
Procurar-se-á uma convergência de políticas em matéria técnica e normativa nos
sectores abrangidos pelo plano de acção, de modo a facilitar a aproximação às
normas da UE e tirar partido das vantagens comparativas de Cabo Verde com vista
ao seu desenvolvimento.
5.5. Sociedade do conhecimento
Este pilar destina-se a promover a evolução do país para a "sociedade do
conhecimento". Atribui prioridade ao desenvolvimento económico, social e cultural,
nomeadamente através da educação, da investigação, e da
apropriação/desenvolvimento das tecnologias da informação (sector no qual Cabo
Verde regista avanços notáveis em matéria de administração pública em linha); estes
factores são particularmente importantes tendo em conta o perfil do país, a sua falta
de recursos naturais tradicionais e a aposta na valorização dos seus recursos humanos
e nos seus trunfos intangíveis, tais como a sua situação geoeconómica.
5.6. Luta contra a pobreza e desenvolvimento
A componente "luta contra a pobreza" contribuirá nomeadamente para realizar os
programas do Governo de Cabo Verde no âmbito do seu documento de estratégia de
crescimento e de redução da pobreza (DECRP). A um nível mais geral, este pilar
também apoiará o plano de acção da parceria especial e a aproximação à Europa que
esta parceria visa concretizar.
As actividades de luta contra a pobreza incluirão a vertente da protecção do
ambiente, a protecção dos recursos naturais e a preservação do meio marinho,
incluindo a luta contra a poluição dos oceanos. O reforço da cooperação no âmbito
do apoio à política nacional da pesca, e nomeadamente a luta contra a pesca ilegal,
não regulamentada e não declarada, contribuirá para a gestão sustentável dos
recursos haliêuticos e para a preservação dos recursos, em benefício da população
local dependente da pesca.
As acções concretas do plano de acção poderão ser identificadas através de estudos que ainda deverão ser decididos; as acções poderão beneficiar de assistência técnica para facilitar a sua execução. Na identificação das acções, deverá ser tido em conta o factor género.
6. FINANCIAMENTO DO PLANO DE ACÇÃO
O FED, incluindo a facilidade de investimento gerida pelo BEI, contribuirá para uma parte
significativa do financiamento da parceria especial. Além disso, recorrer-se-á a outros
instrumentos para apoiar a parceria especial, tais como o FEDER no âmbito da cooperação
com as RUP (Programa de Cooperação Transnacional MAC 2007-2013).
Podem ser apoiadas actividades específicas através das acções externas financiadas pelo
orçamento geral da Comunidade Europeia e pelos recursos próprios do BEI, no contexto do
quadro financeiro 2007-2013, sob reserva de procedimentos específicos e da disponibilidade dos fundos. As actividades financiadas a partir do orçamento geral incluem, nomeadamente, (PT 7 PT) programas financiados através do Instrumento de Cooperação para o Desenvolvimento, tais como os programas temáticos "Investir nas pessoas", "Intervenientes não estatais no processo de desenvolvimento", "Migração e asilo", "Ambiente e gestão sustentável dos recursos naturais" e "Segurança alimentar". Abarcam também actividades financiadas por outros instrumentos, tais como o Instrumento de Estabilidade, o Instrumento para a Promoção dos Direitos Humanos e da Democracia ou o Instrumento para a Ajuda Humanitária e de Emergência.
Estes financiamentos reforçarão os meios que o Governo de Cabo Verde consagra à aplicação do plano de acção. Os Estados-Membros da União Europeia serão convidados a contribuir para o financiamento do plano de acção.
7. DURAÇÃO DO PLANO DE ACÇÃO
A parceria especial é um processo de que o plano de acção constitui o quadro e o instrumento que permite a sua concretização. O plano de acção terá uma duração indeterminada e será revisto periodicamente segundo modalidades estabelecidas de comum acordo.
8. ACOMPANHAMENTO DA APLICAÇÃO DA PARCERIA ESPECIAL
Está previsto um acompanhamento da aplicação do plano de acção sob a forma de reuniões a nível político, que serão organizadas com uma frequência a determinar, e de reuniões anuais a nível técnico, quer em Cabo Verde, quer na União Europeia.
A UE será representada pela "Tróica''.
A nível local, o grupo interministerial criado pelo Governo de Cabo Verde e presidido pelo
Ministro dos Negócios Estrangeiros organizará reuniões regulares de acompanhamento da
parceria especial com a Delegação da CE e as missões diplomáticas dos Estados-Membros.